segunda-feira, 15 de março de 2010

A Sondagem e As Surpresas


1. A sondagem da Universidade Católica, publicada ontem pelo DN, mostra que a maioria dos portugueses (cerca de 64%) considera que temos neste momento um Governo "mau" ou "muito mau", mas, ainda assim, que José Sócrates "é o melhor primeiro-ministro para o País". Se houvesse eleições, no quadro actual (sem o efeito do novo líder no PSD, note-se), o PS voltaria a ganhá-las, até com maior à-vontade do que há cerca de cinco meses. Apesar de tudo, surpreendente.

Nestes resultados, o País real faz uma dupla crítica ao momento que vivemos. A primeira, dura e directa, ao Governo - "é mau". A outra, ainda mais dura e não tão indirecta como isso, aos líderes dos partidos da oposição, sobretudo a Manuela Ferreira Leite, que brevemente abandonará a presidência do PSD - não são alternativa!, nem sequer a um primeiro-ministro desde há dois anos debaixo do fogo de uma série de casos mais ou menos mediáticos e/ou mediatizados.

A sondagem, no fundo, confirma aquilo que o bom senso das pessoas há muito interiorizou: temos escassez de candidatos capazes de desempenharem o cargo de chefe de Governo. Uma maioria significativa de pessoas pensa mesmo que José Sócrates, com todos os defeitos, alguns reais, outros fabricados, é actualmente o único líder partidário capaz de o desempenhar.

Estamos parente uma análise dura, mas esta percepção já esteve na base da reeleição do actual primeiro-ministro. Apesar de nova polémica, continua actual. Se o trabalho, com a insuspeita qualidade da Universidade Católica, puder resumir-se assim - "Portugal não está bem mas não tem alternativa" -, então assino por baixo.

2. Lembro-me bem do embaraço de Jerónimo de Sousa, homem por quem tenho o maior respeito, quando, numa entrevista antes das últimas eleições, lhe enderecei a questão tão concreta como teórica: "O senhor é candidato a primeiro-ministro?" O secretário-geral comunista titubeou, refugiou-se numa futura decisão do Comité Central e tentou escapar à questão para acabar por reconhecer que não seria primeiro-ministro.

Paulo Portas ou Francisco Louçã, pese a qualidade pessoal de ambos na defesa das suas ideias e interesses, também não são candidatos a governar Portugal.

Manuela Ferreira Leite, que à partida tinha até mais perfil para desempenhar o cargo do que para ser líder do PSD, falhou rotundamente no objectivo e por isso vai sair.

3. Esta sondagem deve estar bem presente na opção que os militantes do PSD vão fazer brevemente do seu próximo líder, escolha essa subjacente ao polémico congresso de hoje, em Mafra.

O País precisa que o maior partido da oposição eleja convictamente um homem capaz de ser um forte candidato a primeiro- -ministro e acabe com a inevitabilidade de José Sócrates. Talvez seja por isso que a sombra de Marcelo Rebelo de Sousa continua a pairar sobre o Congresso, estrategicamente encolhido para um só dia no preciso momento em que a Universidade Católica nos revela outra surpresa: Passos Coelho, entre os eleitores nacionais, ganha - por pouco mas ganha - a Paulo Rangel. Será este o caldo necessário para a reviravolta de opções eleitorais do PSD que alguns "notáveis" defendem e Marcelo, mais o seu ponta-de-lança Santana Lopes, tanto desejariam?

Avanço uma outra leitura da sondagem: José Sócrates fez mal em perder tanta energia com a comunicação social. A sociedade civil não anda a reboque da opinião de comentadores. Sabe mesmo julgar a má-fé, quando a ouve ou quando a lê. Tem muito mais capacidade de reflexão e análise do que às vezes se pensa, e até do que pensava Sócrates. Ou surpresa, presumo…
João Marcelino, "Diário de Notícias", 13 Março 2010

Sem comentários:

Enviar um comentário